Implantes mamários de silicone têm sido utilizados na prática médica desde 1962, tanto em cirurgias reconstrutivas quanto estéticas. Durante muitos anos, o silicone foi visto como uma substância biologicamente inerte e segura. No entanto, nos últimos anos, o surgimento de sintomas semelhantes a doenças autoimunes em algumas pacientes com implantes mamários levou pesquisadores a sugerir uma possível ligação entre esses sintomas e a presença dos implantes.
O Que é?
A Síndrome ASIA (Autoimmune Syndrome Induced by Adjuvants) ou Síndrome do Silicone é uma condição em que o sistema imunológico é ativado por adjuvantes, levando ao desenvolvimento de sintomas autoimunes ou inflamatórios.
Esses adjuvantes podem estar presentes em vacinas, próteses de silicone, medicamentos e outros materiais que entram em contato com o organismo. Assim, embora muito raramente, o silicone das próteses mamárias pode ser o gatilho para o desenvolvimento de resposta inflamatória ou autoimune em pessoas com predisposição genética.
A condição recebeu atenção nos últimos anos devido à associação com implantes de silicone e outras substâncias que provocam uma reação autoimune em indivíduos suscetíveis.
Como Surgiu o Conceito da Síndrome ASIA?
O termo “Síndrome ASIA” foi criado em 2011 por Yehuda Shoenfeld, que é um dos principais pesquisadores na área de doenças autoimunes. A proposta surgiu após observar que algumas condições autoimunes compartilhavam um denominador comum: a exposição a adjuvantes. Isso levou à ideia de agrupar várias condições, como a síndrome da Guerra do Golfo, a síndrome da fadiga crônica e a doença do silicone, sob um mesmo grupo diagnóstico. A proposta visava ajudar no reconhecimento e tratamento de pacientes que apresentavam sintomas relacionados ao uso de adjuvantes.
Causas
Embora ainda não se saiba exatamente como os implantes de silicone podem desencadear problemas autoimunes, alguns mecanismos possíveis foram identificados. Por exemplo, certas moléculas do silicone podem vazar do implante e se espalhar pelo corpo, mesmo que o implante esteja intacto. Isso pode transformar a resposta normal do corpo, que é a formação de uma cápsula ao redor do implante, em um processo inflamatório crônico.
O silicone no organismo pode desencadear uma inflamação, onde células de defesa capturam partículas de silicone e liberam substâncias que causam uma reação inflamatória. Esse processo pode continuar repetidamente, gerando uma inflamação persistente. Em algumas pessoas, essa resposta pode se tornar crônica e levar ao desenvolvimento de uma reação autoimune.
Outro possível fator é que infecções podem agir como gatilhos, ativando o sistema imunológico de maneira anormal e desencadeando uma reação contra os implantes de silicone.
Sintomas
Os sintomas da Síndrome ASIA são bastante inespecíficos e podem variar bastante, dependendo do tipo de adjuvante e da resposta individual do sistema imunológico. Entre os sintomas mais comuns, estão:
– Fadiga intensa e persistente
– Dor nas articulações e músculos
– Dor e inchaço generalizado
– Febre baixa
– Distúrbios do sono como insônia
– Queda de cabelo
– Distúrbios gastrointestinais como Síbdrome do Cólon Irritável
– Ressecamento de mucosas como boca e olhos
– Problemas de memória e concentração (névoa mental)
– Distúrbios neurológicos, como dormência e formigamento
– Síndrome de Raynaud (mãos e pés que ficam pálidos ou azulados em resposta ao frio ou estresse)
– Erupções cutâneas e alterações na pele
Esses sintomas podem aparecer logo após a exposição ao adjuvante ou podem surgir anos depois. A falta de um padrão claro e consistente de sintomas torna o diagnóstico desafiador.
ASIA é Considerada uma Doença?
A Síndrome ASIA ainda é um conceito controverso na medicina, pois não existe um consenso claro sobre sua definição e diagnóstico. Alguns médicos e pesquisadores consideram a ASIA uma condição legítima, enquanto outros acreditam que faltam evidências científicas suficientes para caracterizá-la como uma doença específica. No entanto, para pacientes que sofrem com os sintomas associados, a condição é muito real e afeta significativamente a qualidade de vida.
Embora não esteja oficialmente reconhecida como uma doença isolada por todas as organizações de saúde, o conceito da Síndrome ASIA tem sido útil para entender como o sistema imunológico pode reagir a adjuvantes em alguns casos. Ainda são necessários mais estudos para confirmar sua validade como uma entidade clínica independente.
Diagnóstico
O diagnóstico da Síndrome ASIA é clínico e baseado na observação dos sintomas e no histórico de exposição a adjuvantes. Não existe um exame laboratorial específico e nem exames de imagem para confirmar a condição. Geralmente, é importante descartar outras causas possíveis para os sintomas antes de considerar o diagnóstico de ASIA.
No Brasil, o diagnóstico é realizado a partir da presença de dois critérios maiores ou de um critério maior e dois menores.
Entre os critérios maiores, encontram-se
* Exposição a estímulos externos, como silicone;
* Aparecimento de uma das manifestações clínicas:
– mialgia, miosite ou fraqueza muscular;
– artralgia e/ou artrite;
– fadiga crônica, sono não reparador ou distúrbios do sono;
– manifestações neurológicas;
– alteração cognitiva e perda da memória;
– febre; boca seca;
* Melhora dos sintomas após a remoção do silicone.
* Biópsia típica dos órgãos envolvidos
Já os critérios menores são:
* Desenvolvimento de autoanticorpos dirigidos contra o adjuvante suspeito;
* Outras manifestações clínicas, como cólon irritável;
* Desenvolvimento de doença autoimune, como esclerose múltipla e esclerose sistêmica.
Entre os pacientes que apresentam maiores riscos de desenvolver a síndrome ASIA, acredita-se que estão aqueles que apresentam predisposição genética, deficiência da vitamina D., relato de reação autoimune a outros adjuvantes, condições autoimunes já diagnosticadas (ex. artrite reumatoide), história de alergia e doenças atópicas e história familiar de doenças autoimunes.
Tratamento
O tratamento é focado no controle dos sintomas e na remoção do adjuvante, quando possível. Algumas estratégias incluem:
– Medicamentos anti-inflamatórios: para reduzir a dor e a inflamação.
– Imunossupressores: para controlar a resposta autoimune, em casos mais graves.
– Terapia imunomoduladora: em alguns casos, para regular a atividade do sistema imunológico.
– Terapias de suporte: incluindo fisioterapia, terapia ocupacional e tratamento psicológico, para ajudar a lidar com os sintomas e melhorar a qualidade de vida.
– Remoção de implantes ou adjuvantes: se houver suspeita de que um implante, como uma prótese de silicone, esteja desencadeando a resposta autoimune, a remoção pode ser recomendada. No entanto, essa decisão deve ser cuidadosamente discutida entre o paciente e o médico.
Remover o implante de silicone pode ajudar a reduzir ou até eliminar os sintomas da Síndrome ASIA. Isso é uma vantagem em comparação com vacinas, onde não é possível remover o agente que causou a reação, e o tratamento geralmente se concentra apenas em aliviar os sintomas.
No entanto, como as doenças autoimunes podem se manifestar de formas diferentes em cada pessoa, os sintomas podem continuar mesmo após a retirada do implante, pois ainda não existe uma cura definitiva para essa condição.
Conclusão
A Síndrome ASIA é um conceito relativamente novo que agrupa diferentes manifestações autoimunes e inflamatórias associadas à exposição a adjuvantes.
Embora ainda haja controvérsias sobre sua classificação como uma doença específica, a condição é importante para o reconhecimento e tratamento de pacientes que apresentam sintomas inexplicáveis após contato com certos produtos. O entendimento de como o sistema imunológico pode ser influenciado por adjuvantes é essencial para melhorar o diagnóstico e o manejo dessas condições.
A principal crítica à síndrome ASIA está nos critérios diagnósticos, que são amplos e pouco específicos. Isso pode levar ao diagnóstico de pacientes com outras doenças autoimunes ou mesmo de pessoas que apresentam os sintomas, mas não têm nenhuma condição autoimune.
Além disso, remover a prótese mamária não garante a melhora dos sintomas. Alguns pacientes relatam alívio definitivo após a retirada, outros sentem uma melhora temporária, enquanto alguns não notam diferença.
Para pacientes que suspeitam ter a Síndrome ASIA, é importante consultar, além do mastologista, um alergologista e um reumatologista para uma avaliação completa e individualizada.